domingo, 4 de outubro de 2009

Sobre a obra máxima de Cervantes














O livro Dom Quixote de La Mancha, escrito por Miguel de Cervantes y Saavedra (1547-1616), iniciado em 1602, pode ser considerada a melhor literatura de ficção de todos os tempos.


Composta de 126 capítulos de loucuras, amizades, sabedoria e encantamentos, são divididas em duas partes: a primeira surgida em 1605 e a outra em 1615.

A obra se baseia numa sátira às histórias de cavaleiros, muito em voga naqueles tempos.


Dom Quixote, depois de uma caçada, sentiu-se extremamente fadigado e moribundo.

Clama por ajuda e é atendido rapidamente.

Levam-no ao seu leito.

O cavaleiro, de súbito, percebe a presença da morte.

Magérrimo por toda sua existência terrena, sempre dispôs de saúde suficiente para aventurar-se pelo mundo quando bem entendera.

Vivia junto a agregados num brejo seco em La Mancha e passara seus dias inúteis lendo os feitos dos heróis de cavalaria.

Venerava-os e os tinha como ídolos e exemplos de vida profícua.


Mas um dia, de tanta leitura, seus miolos se entupiram.

Afinal, muitas lendas povoavam sua mente senil.

Um médico foi chamado e a recomendação foi à busca da salvação da alma, porque o corpo iria sucumbir brevemente.


A personagem, Amadis de Gaula, o espadachim fantástico, até então idolatrado por Quixote, passou a ser por ele odiado.

Coisas estranhas aconteciam na mente daquele enfermo homem.

Mas, num lapso de serenidade pôs-se a esperar pela morte.

Queria se livrar dos fantasmas literários que nutriam seus pensamentos doentios.

Subitamente algo ocorreu...


Com berros enfáticos, o velho Dom Quixote disse ter restaurado plenamente o juízo, livrara-se das malditas leituras que fizera sobre os feitos dos cavaleiros por toda sua vida e ordenou que pusessem uma sela em seu ordinário cavalo, Rocinante, calçou suas velhas botas e armou-se como seus antepassados: um escudo enferrujado e uma lança torta e, num ímpeto, partiu em busca de aventuras em terras castelhanas que lhe trouxessem renome e glória.

Suas andanças foram ricas em intempéries e impasses fortuitos.

Fantasiou o amor por uma dama ilusória, Dulcinéia Del Tomboso, e nutriu amizade fraterna com o camponês gorducho Sancho Pança.


“Esta que vês de rosto amondongado,

Alta de peitos, e ademã brioso

É Dulcinéia, rainha Del Tomboso,

De quem esteve o grão Quixote enamorado...” (pag. 339)


Sua grande frustração era com sua contemporaneidade.

Dizia que a invenção da pólvora estragou tudo.

Acabou-se com os nobres cavaleiros, que, ao ouvirem um disparo, fugiam rapidamente com suas lanças a balançar para o horizonte.

Em seu livro, Cervantes usa um pragmatismo crítico, do escudeiro que revela um conhecimento do mundo distante dos questionamentos e indagações do cavaleiro sobre a existência terrena, a morte e os dogmas sagrados.

Ambos carregam consigo, um conhecimento filosófico empírico e juntos esses conhecimentos se interagem e se completam.


“Tiram as almas dos eixos, as grandes forças do amor, são os cuidados do ócio, seu instrumento melhor.” (pag. 551)


Com uma visão cética, porém concisa, o escudeiro não procura respostas, já as tem pela experiência de vida.

Domina o tempo e não tem medo de enfrentar a tão temida morte.

Sancho Pança sabe transitar entre o mundo da taverna, das brigas, da morte e das agruras mundanas, sublimada empiricamente e recheada de filosofia existencialista em que se encontra o romântico cavaleiro.


"(...) Aqui jaz quem teve a sorte

De ser tão valente e forte

Que o seu cantor alegrou

Que a morte não triunfou..."

(pag.677)



*Meu exemplar: Editora Nova Cultural, São Paulo: 2002

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