domingo, 8 de novembro de 2009

Zé-do-Burro, o pagador de promessas




Vi tudo de longe, pela grande tela

Zé-do-Burro, faca em punho, avança pelas escadas velhas

Pelo sacro-dever, o padre o impede, a promessa não se cumprirá

O delegado antecipa-o, quem lhe desafiará?

O povo lhe defende, surge uma onda humana

Na confusão ouviu-se um tiro, uma consternação

No meio da multidão, olhei para o lado, doía-me o coração

Estouro de boiada, corre-corre, dispersão

Na porta da igreja escolhida, Zé-do-Burro, jaz ao chão

Rosa grita, um choro em explosão

Lá vem o padre, sinal da cruz

Encomenda da alma do pobre moribundo sertanejo

Rosa o afasta, com olhar de desprezo

O Mestre Coca, capoeirista, faz gesto preciso aos companheiros

Inclinam-se sobre o corpo estendido na ladeira

Fixam-no na cruz da promessa vã

Numa nobre homenagem derradeira

Carregam-no assim, como um crucificado

O padre recua sobre os degraus ensanguentados

Avançam-no, pela entrada principal

Arrombam a porta, dirigem-se ao altar, numa entrada triunfal

Termina a peregrinação, cumpre-se a promessa ao burro Nicolau



*O Pagador de Promessas é um filme brasileiro de 1962, vencedor da Palma de Ouro em Cannes, dirigido por Anselmo Duarte (Salto, 21 de abril de 1920 - São Paulo, 7 de novembro de 2009), baseado na peça teatral de Dias Gomes.

*A Anselmo Duarte e sua obra-prima, minha homenagem póstuma em forma de prosa-poética.

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