Vi tudo de longe, pela grande tela
Zé-do-Burro, faca em punho, avança pelas escadas velhas
Pelo sacro-dever, o padre o impede, a promessa não se cumprirá
O delegado antecipa-o, quem lhe desafiará?
O povo lhe defende, surge uma onda humana
Na confusão ouviu-se um tiro, uma consternação
No meio da multidão, olhei para o lado, doía-me o coração
Estouro de boiada, corre-corre, dispersão
Na porta da igreja escolhida, Zé-do-Burro, jaz ao chão
Rosa grita, um choro em explosão
Lá vem o padre, sinal da cruz
Encomenda da alma do pobre moribundo sertanejo
Rosa o afasta, com olhar de desprezo
O Mestre Coca, capoeirista, faz gesto preciso aos companheiros
Inclinam-se sobre o corpo estendido na ladeira
Fixam-no na cruz da promessa vã
Numa nobre homenagem derradeira
Carregam-no assim, como um crucificado
O padre recua sobre os degraus ensanguentados
Avançam-no, pela entrada principal
Arrombam a porta, dirigem-se ao altar, numa entrada triunfal
Termina a peregrinação, cumpre-se a promessa ao burro Nicolau
*O Pagador de Promessas é um filme brasileiro de 1962, vencedor da Palma de Ouro em Cannes, dirigido por Anselmo Duarte (Salto, 21 de abril de 1920 - São Paulo, 7 de novembro de 2009), baseado na peça teatral de Dias Gomes.
*A Anselmo Duarte e sua obra-prima, minha homenagem póstuma em forma de prosa-poética.
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